NOTAS SOBRE UM DESTERRO (2025) – FALE SOBRE A PALESTINA

NOTAS SOBRE UM DESTERRO (2025) -FALE SOBRE A PALESTINA

“Fale sobre a Palestina”, foi a primeira frase que escutei de Gustavo Castro, diretor do documentário “Notas Sobre um Desterro” (2025), assim que cheguei na sessão durante o 14º Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba. Sua fala, acima de qualquer mensagem, tinha como objetivo nos incentivar a espalhar que há quase 80 anos (no mínimo) o povo palestino é vítima de um Apartheid por parte de “Israel”.

Cine Passeio da exibição do documentário. Curitiba–PR. 14/06/2025 – Fonte: Victor Finkler – Imprensa – Película

É um exercício quase de insuficiência. Enquanto crítico e imprensa de um festival de cinema, o que posso agregar em tudo isso? Sinto que tudo parecerá insuficiente, que não abrange o bastante o sofrimento e o extermínio sistemático de um povo, da dor de todos os seres humanos que estão passando fome, frio, dor, perda, traumas, desolação e desamparo. São apenas palavras que vejo em minha frente, e são todas invenções sobre conceitos e sofrimentos de uma experiência para além de minimamente compreensível por mim.

Esse acaba por ser meu objetivo falho, resumir, apresentar, ensaiar e elaborar em cima de uma obra cinematográfica. As palavras não são as imagens, e o regime das imagens acaba sendo a articulação central do documentário. Reunindo o material gravado pela equipe paranaense na Palestina em 2018, eles viram a necessidade de reelaborar tudo que foi feito para eles com a escalada do genocídio a partir de outubro de 2023.

O resultado final é um grito de desespero frente à tempestade ruidosa de imagens que nos atravessam dia após dia. O regime de imagens, como Godard quis exercitar em seu documentário experimental “Aqui e em Qualquer Lugar” (1976), também sobre a questão Palestina, nos é atualizado não como as imagens enquanto sintomas de um século que não encontrou mediações, como foi o século XX. O regime de imagens da questão Palestina no século XXI pode ser visto enquanto controle não apenas do como é visto, como ocorreu com a elaboração artificial de um Outro distante, estereotipado e significado enquanto ameaça desumanizada pelo Orientalismo, que, como nos ensina Edward Said, enquanto Oriente é uma invenção do ocidente, justifica a exploração e a repulsa por parte de todos os povos de uma mesma região do planeta.

Na realidade neoliberal de novas formas de controle dos meios de produção espirituais, sobretudo de redes sociais e demais plataformas, bem como as IA’s de geração de conteúdo online; os algoritmos e demais ferramentas de conduta, censura e entrega são pautados pelas diretrizes ocultas de grandes corporações, financiadas por meios publicitários como maior fonte de arrecadação de renda.

No cenário de controle e manutenção do conteúdo online, é mais que normal que produções de imagens sobre um genocídio sejam acobertadas e removidas por parte das plataformas como forma de invisibilizarem a narrativa sanguinária do colonialismo e imperialismo contemporâneo. De maneira desvelada, o genocídio mais registrado da história continua oculto ou distorcido para uma parcela considerável dos usuários.

O cotidiano de violência e opressão registrado pelos documentaristas em 2018 mostra a calma repressão diária vivida pelos palestinos. Em contraposição, às imagens históricas do Nakba (em árabe النكبة, literalmente “catástrofe” ou “desastre”, refere-se à limpeza étnica de árabes da Palestina, a partir de 1947 até o presente), nos lembram a trajetória desse Apartheid. Também para essa finalidade, nos é feita uma contextualização histórica do sionismo, e a fala de Ualid Hussein Ali Mohd Rabah, Presidente da FEPAL – Federação Árabe Palestina do Brasil, sobre as etapas da limpeza étnica praticada por “israel” ao longo da história pós-Segunda Guerra.

A didática de um documentário direto sobre a violência praticada contra alvos bem determinados. E, além disso, o filme entende a complexidade fragmentária de uma pós-modernidade na qual a maneira como o “fora” (restante do mundo) compreende o “dentro” (conflito in loco) pela lógica de produção e recepção de conteúdos online comentados anteriormente.

Espero nunca saber o que é comer farinha com areia para não morrer de fome, o que é tentar resgatar um familiar no meio de escombros de um edifício, ver um irmão tomar um tiro na cabeça tentando pegar comida, carregar o braço de um parente para poder enterrar, já que foi a única coisa que sobrou. Pensar: “como alguém passa por tudo isso e continua tentando viver?”, que potência é essa, que resistência e afeto mantêm o ser humano com a necessidade de lutar, pois nesse contexto estar vivo é um ato de luta.

Não sei o que é passar minimamente próximo de qualquer uma dessas situações, mas sei que estão passando por isso e atrocidades ainda maiores, sei que pessoas estão vivendo e que elas estão na Palestina. Mesmo que tentem ocultar ou diluir no meio do mar de inutilidade de conteúdos reais, ou de IA, eu sei que essas pessoas existem. Fale sobre os palestinos, fale sobre a Palestina.

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PALESTINA LIVRE 🇵🇸

Autor

  • Victor Finkler Lachowski

    Doutorando em Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Paraná (PPGCOM-UFPR), vinculado à linha de pesquisa Comunicação e Cultura; Mestre em Comunicação (PPGCOM-UFPR); Bacharel em Publicidade Propaganda (UFPR). Integrante do NEFICS - Núcleo de Estudos de Ficção Seriada e Audiovisualidades (UFPR/PPGCOM-UFPR/CNPq). Sócio da Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual (SOCINE). Bolsista CAPES-DS. Escritor, Roteirista e Redator. Autor da coletânea de contos "O Insosso e o Insólito entre os Pinheirais". Escritor da Revista Película (ISSN: 3085-6183). Pesquisador nas áreas de: Comunicação; Cinema; Cultura; Narrativas Audiovisuais; Narrativas Midiáticas e Comunicação Política.

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