DOENTE DE MIM MESMA: O ADOECIMENTO CAUSADO PELO EXCESSO DE EXPOSIÇÃO ÀS REDES SOCIAIS
Sick of Myself (Doente de Mim Mesma) é um filme norueguês escrito e dirigido por Kristoffer Borgli. Classificado no IMDb como comédia, drama e terror, o longa teve sua primeira exibição no Festival de Cannes em 22 de maio de 2022 e estreou nos cinemas noruegueses em 9 de setembro de 2022, com distribuição da Scandinavian Film Distribution.
Embora tenha sido lançado em 2022, o filme vem ganhando cada vez mais popularidade recentemente, não pelo seu conteúdo profundo e crítico, mas por conta de sua estética, do seu pôster e, principalmente, do seu título. Doente de Mim Mesma se tornou uma frase que ressoa com o público mais jovem, especialmente nas redes sociais, porque traduz um sentimento bastante contemporâneo: o cansaço de si próprio. Muitas pessoas acabam chegando ao filme justamente por esse motivo, sem saber o verdadeiro teor da narrativa, o que, de certo modo, repete o fenômeno criticado pelo próprio longa.
A história acompanha Signe, que se sente invisível quando comparada ao seu namorado, Thomas, um artista cujo trabalho é produzido a partir de móveis e objetos furtados e que agora está ganhando notoriedade. Os dois não disputam a atenção um do outro, mas sim a atenção do público. O filme inteiro é uma competição por atenção, em que ambos os personagens fazem de tudo para serem vistos e reconhecidos.
Depois de uma série de experiências frustrantes para ser notada, Signe descobre um remédio que causa lesões na pele e passa a tomá-lo deliberadamente para simular uma doença e, assim, atrair a atenção das pessoas. A partir daí, o filme mergulha no desenrolar dessa doença fictícia, mostrando como o adoecimento psicológico pode se tornar visível quando há uma necessidade de validação.
Durante o longa, os dois personagens exploram formas diferentes de narcisismo: Thomas, de maneira egocêntrica e já familiarizado com o status da fama; Signe, de forma desesperada e artificial.
Apesar do rótulo de comédia, o longa aposta em uma comédia ácida, com elementos de body horror nas cenas gráficas relacionadas às feridas de Signe e um forte componente dramático. O filme também apresenta momentos de imaginação e ansiedade, nos quais Signe se vê rica, famosa e admirada, para logo depois ser trazida de volta ao presente e confrontada com sua realidade, o que reforça a distância entre quem ela é e quem gostaria de ser.
Com o tempo, Thomas é preso por roubar os objetos usados em suas obras. Até então, ele e Signe moravam juntos e, quando a polícia retira todos aqueles itens roubados do apartamento, praticamente 90% do espaço fica vazio. O que sobra é apenas Signe em um ambiente vazio, que funciona como espelho do seu próprio estado mental: superficial, sem autenticidade e sem identidade. Ali, restam apenas ela e o grande vazio de não saber quem realmente é.
O filme estabelece uma crítica muito clara às redes sociais e à naturalização da exposição constante. Hoje, tratar assuntos extremamente pessoais como conteúdo público parece algo comum, e isso produz uma forma de adoecimento que passa despercebida justamente por não ter, inicialmente, um sintoma visível. Na sociedade de consumo atual, nós nos tornamos o que é consumido e, dessa maneira, não resta nada — e adoecemos. Tanto Thomas quanto Signe, ao final, acabam sendo afastados desse circuito de exposição: ele, por meio da prisão; ela, internada em um centro de tratamento mental. Apenas longe do olhar constante do outro é que o ciclo da busca por atenção pode, finalmente, ser interrompido.
No fim, Sick of Myself se torna não apenas uma crítica àquilo que acontece nas redes, mas também um reflexo da própria maneira como o filme é consumido por muitos espectadores atraídos por uma estética viral, sem saber que o verdadeiro tema é justamente a superficialidade dessa estética.
Autor
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Natural de Porto Alegre (RS), formada em Produção Audiovisual pela PUCRS, com curso de extensão em Escrita Criativa. Realizadora audiovisual, com foco em desenvolver projetos que inspiram e causam impacto, esse é o seu foco editorial e artístico.
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